Geraldo Vandré e Alegrete

Como comentei que gosto da música Pra Não Dizer Que Não Falei das Flores, o Grillo me mostrou uma reportagem que contava a passagem de Vandré por Alegrete, este fato é desconhecido por muita gente.
Transcrevo aqui uma parte da reportagem na “Coleções caros amigos – a ditadura militar no Brasil o governo Geisel – extinta a luta armada”, infelizmente não tenho mais dados sobre a postagem, nome da editora, ano... pois só tenho um xérox da reportagem.

Márcio Mombach



A jornalista Ana Cavalcanti namorava Vandré quando o AI-5 e militares da linha-dura estavam à caça dele. Ana e o pai arriscaram a pele para pô-lo a salvo.

“Como Geraldo Vandré fugiu da ditadura

ANA CAVALCANTI – ESPECIAL PARA ESTA COLEÇÃO

Quando tocou a campainha da minha casa, em vila Mariana, Geraldo Vandré era a ultima pessoa que esperava encontrar no portão. Depois de ovacionado no III Festival Internacional da Canção, no Rio, em 1968, ele decidiu fazer um show no Teatro Opinião, Pra Não Dizer Que Não Falei das Flores, ou Caminhando. Acompanhado de músicos talentosos, Naná Vasconcelos entre eles, o espetáculo tinha começado havia poucas semanas e eu não imaginava vê-lo tão cedo em São Paulo.
Aquela não era uma visita como as outras. Geraldo estava angustiado, falava muito depressa. O AI-5 havia sido decretado. Ele achava a situação extremamente grave e não queria ficar na apartamento dele, na alameda Barros...

Começaram os preparativos para tirar Vandré do país. O plano traçado: ele atravessaria a fronteira do Brasil com o Uruguai, de lá , ganharia o mundo. Primeiro chegaria a ALEGRETE, cidade gaucha a uma centena de quilômetros tanto do Uruguai quanto da Argentina. Uma família amiga o ajudaria a atravessar a fronteira.
Lembro que Geraldo não tinha passaporte. Ou melhor, tinha. Mas que , eu o guardei numa bolsa junto com um vidro de perfume. O perfume vazou e o passaporte ficou inutilizado.
Geraldo escolheu papai para levá-lo até ALEGRETE. Tínhamos uma Kombi. Contratamos um motorista e pegamos a estrada de madrugada. Meu pai e o motorista foram se revezando na direção. Paramos apenas para almoçar em uma churrascaria de beira de estrada. No ambiente simples e descontraído, com musica tocando alto. De repente ouvimos “Caminhando”. O susto foi enorme. Ficamos paralisados, achando que puseram a musica porque haviam reconhecido Geraldo, mas não. Era apenas um sucesso tocando.
Depois de viajar bem mais de 1.000 quilômetros, entregamos Geraldo à família em ALEGRETE. Conversamos alguns minutos e eu, papai e o motorista pegamos a estrada de volta. A despedida pra mim foi sofrida, chorei, mas Geraldo estava bem, dentro das circunstancias. Isso aconteceu em 1969.
Só fui vê-lo novamente em 1973, quando voltou ao Brasil. Encontrei um Geraldo bem diferente daquele homem de quem me despedi em ALEGRETE. Não saberia explicar o que aconteceu com a cabeça dele, nem quero tentar. O que faço questão de dizer é que Geraldo nunca foi preso nem torturado, como muita gente pensa e muitos jornais, livros e revistas, erroneamente, publicaram.
Hoje, Geraldo vive em um apartamento no centro de São Paulo, sozinho, tendo por companhia centenas de jornais de décadas passadas, empilhados nas várias mesas da sala. Viaja de vez em quando. Há pouco, passou uma temporada na Paraíba, onde nasceu. Não grava mais, não se apresenta na TV. Mas continua poeta e compondo. Isso a ditadura não consegui mudar.”

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